quarta-feira, maio 17, 2006

A manta...



Quando o tempo me ganhar
e a paz na alma
pousar,
vou editar todos os livros
que não escrevi.
Com as lãs
e as cores
escreverei as palavras
que não soube pronunciar.
no momento certo.
mas senti

-como se sente o verão a chegar.
E nas linhas feitas de lã

alquimicas palavras
escritas por intuição
da pele,

frageis como lagrimas
serão
cristais.


Quando o tempo me ganhar
vou ficar um ano
sentada
no fogo que me afastará a morte
das pernas,
dos ossos,
e à lareira,
na distancia cálida -apaziguadora,
que essa serenidade me trará,
vou compreender por fim
porque fui assim.
compreender as entranhas
estranhas
de
uma manta de lã
tecida
nas cores das lãs
que o tempo
me ha-de ditar.

Deixarei o vermelho
da paixão
à solta na manta
e entenderei
o instinto
o impulso
que me fez segui-lo.

E tecerei as rolas que cantavam
nas manhâs de sabado
doce voar sobre o tempo do provir.
sinto já o calor da lã
nas minhas mãos
ao possuir o azul
infinito
do mar
que brincou
se agigantou
e que serenou
em mim...

De mel tingirei a lã
para os olhos das minhas filhas.
pois de mel elas se untarão
para me sentarem
aqui na minha manta
mantra
e me apaziguarem a sede.
verde.
das árvores e dos campos
que bebi
que deixei ocupar
nestes olhos
depois visionários
sabios.
A fome
da cor
dos homens.

Deles farei o fio
condutor
às estradas

cor de terra
da minha manta.
os que me encantaram

e não encontraram,
mas aqui bordo.
Ponto a ponto.

Quando apenas o fogo da lareira
me aquecer
vou deixar a branca

serenidade
escolher todas as cores.
Alinhavo.
Na manta
o amor será
de todas as cores.
Ocupará,

livre nas texturas
perfumes
e, embriagado de especiarias
sem sentido,
sentido será
de fogo e de neve
pau santo
ópium

ébano
marfim
cidreira
laranjeira em flor

pimenta açafrão
mas será sempre amor.

Os devaneios
queimar-se-ão
no fogo que agora
sinto nas mãos
das cores das lãs
pelos fios de lã
que passam rapido
esguios os fios

sem corpo
pelos meus dedos.
Guerras

pactos
afagos
anil.

Mil.

Nos nós dos dedos
roxos,
os nós das lãs
grossos,
os nós da vida
negros,
na palma da mão
resolvidos.
Ponto cruz.

Na cor do riso
em missangas,
amarelo talvez
às vezes ácido,
outras rosa

-tantas rosas
ponto pé de flor
na vã tentativa de quebrar
os muros
cor de tijolo
os silencios
pardos
os medos
cinzentos
do vazio
de cor.

Cruzada
ganha,
a manta,
pesa-me agora.
Não tenho mais cores
mais lãs.
Protejo-me na manta.
Estou sentada há uma vida
e gastei o arco íris.


Agora o fogo que a consuma.