quinta-feira, setembro 21, 2006


Houve um tempo de mim, longe do mundo.

Como se o fio invisível que me liga aos outros, se tivesse quebrado.

Como se eu só os conhecesse de vista.
Ou como se só existissem em sonhos.

Num plano paralelo ao meu, mas tão infinitamente longínquo, que fosse racionalmente inadmissivel algum dia nos termos cruzado ou termos sido feitos da mesma matéria.

Passava pelos outros rostos com a estranha sensação de que os conhecia de algum lado e olhava surpreendida a quantidade de números de telefone, completamente desnecessários, que o meu telemóvel encerrava em si.

Talvez seja a isso que dão o nome de solidão.

A capacidade de nos desconectarmos do mundo.

Completamente.

Havia contudo, quem me beliscasse. Quem não se sentisse desmotivado pelo aparente desinteresse na minha própria vida e me levasse a procurar perguntas e respostas.

Sem asas ou rosto, um cheiro ou uma voz, o anjo apareceu-me e falou-me de si.

Dizia-me termos coisas em comum, profissão, filhos, idade.
Falou-me de livros, que só comprei para lhe fazer a vontade.


Em Busca da Alma Gémea...e... o Alquimista.

O primeiro enfureceu-me.

O segundo fez-me rir.

A fúria era saudável, advinha da amargura de saber que raramente duas almas se entregam numa dádiva plena de partilha da sua intimidade e verdade...que raramente nos casamentos existe essa intimidade verdadeira, do despojo de fachadas...de nos mostrarmos na nossa mais intima essência...

O riso foi irónico...e fez-me abanar as estruturas.
Porque afinal o livro me remetia para mim própria.
Para o lugar da partida.

E de mim, andava eu farta.

O anjo, mesmo assim, não desistiu.

Tomou forma de sms, porque no mundo dos anjos todas as formas são concebíveis e perfeitamente naturais.

Durante muitos, muitos meses, era a única pessoa a dar-me os bons dias, de uma forma especial, carinhosa e motivadora. Também era o único que me fazia olhar o céu. Sorrir.

E às vezes, sonhar.

Sonhar que na floresta não existissem só lobos maus.
Mas também anjos vestidos de sms que de manhã bem cedo se lembravam das avós incautas que andavam pelos caminhos da vida...

Algumas vezes ao longos dos meses -anos?-o anjo pediu para tirar a máscara de formato texto e a que fui, desse tempo, nunca aceitou.


...E à medida que me ia conectando de novo com o mundo, o anjo ia desaparecendo...
...como se adivinhasse que já me não era necessário...como se tivesse receio de incomodar o mundo...agora que eu já fazia de novo parte dele...

Mantive até hoje o milagre da sua aparição, à luz misteriosa do acaso.

Quando fiquei sem o meu telémovel, lembrei-me do anjo sem asas.

Nunca mais lhe poderia enviar o meu sorriso?

Entreguei ao acaso do destino o destino desse anjo e dos meus sorrisos.

Desses acasos que nos fazem encontrar pessoas, predestinadas a iluminar o caminho das outras ou ajudando-as a procurarem o seu próprio caminho...

Que dão tanto de si e do seu tempo pelo simples prazer de semear a alegria, a serenidade, a harmonia...

E que partem, altruístas, antes do tempo das colheitas...





Obrigada Z. por teres sido o braço que me amparou naquelas manhãs cinzentas, em que só por tua causa, para te responder, procurei o sol :)


Bem Hajas!